segunda-feira, 9 de abril de 2012

Crônicas Steampunk- Choque


Acordei às 6:00 da manhã, com um apito de locomotiva. Pronto. O dia começou.
Virei para o lado. Meu irmão já se vestia. Todos os dias, de manhã, ele tinha de se levantar cedo, para trabalhar na fábrica. Ele tossiu.

- Tome cuidado- eu disse. Tossiu novamente.

- Obrigado.

- Tente não pegar uma pneumonia

- Eu não prometo nada.

Sorri. Não devia ter feito isso. É tão horrível. Meu pai foi forçado a se aposentar porque estava muito doente. Agora, Hazard tem de ir todo o dia para aquela fábrica suja. Enquanto seus chefes fumam cigarros franceses nas salas de comando. Eu odeio a sociedade. É tudo tão injusto.

- Boa sorte no seu trabalho- disse Hazard. O significado do nome dele é “sorte”. No mundo em que vivemos, realmente precisamos ser sortudos.

- Boa sorte no seu- eu repliquei sorrindo. Quando ele saiu, eu enchi a bacia pela metade com água fria. Tomei um banho rápido. Peguei meu uniforme escolar. Tenho 14 anos. Temos que ir para a escola até os 15 anos. Eu já planejei minha vida: Largarei a escola daqui há 1 ano. Trabalharei consertando locomotivas, como minha tia ensinou-me antes de morrer. Eu e Hazard conseguiremos dinheiro para pagar a faculdade de Jasper. Ele se tornará próspero. 

Terá estudado. Será melhor que seus irmãos.

O uniforme da escola é a roupa mais chique que tenho. Camisa azul, saia preta, avental. Prendo meu cabelo em um coque desajeitado e coloco um lenço preto. Hora dos estudos.
Temos que ficar na escola de 7:00 até 13:00. Aí ficamos livres para fazer o que quisermos. A maioria de nós trabalha. Eu ajudo minha prima Irene consertando as locomotivas. Tia Godfreya, a mãe de Irene, nos ensinou a consertar locomotivas como ninguém. Hora de retribuir o favor.

Na escola, primeiro tocamos o hino. Juramos fidelidade a rainha e a bandeira. Depois entramos.

A primeira aula do dia é Educação Patriótica. Onde se exaltam os heróis e se exorcizam os vilões. No início da aula, sempre é contada a mesma história. De como uma guerra entre o Império Americano e a União Arábica destruiu boa parte da civilização. Sobre como todos nós nos levantamos das cinzas. Como agora, passados 1914 anos da Guerra (o tempo é contado como antes e depois da Guerra, portanto estamos em 1914), estamos fortes. Unidos sob a monarquia dos Lannork. Como o Império Britânico é o maior do mundo, desde os romanos. Exaltando as qualidades do Rei, do príncipe de Gales e da Rainha. A doçura das princesas. As qualidades de uma monarquia semi-constitucional. É tudo tão cansativo.

As outras aulas foram Leitura (hoje, Amós, capítulo 1 inteiro), Aritmética e Física (jogamos tênis). Depois, as Aulas Práticas: Costura e artes. Aulas práticas. Seria uma aula prática se eles ensinassem sobre como manusear uma solda. Isso seria uma verdadeira aula prática.

Almocei na escola e logo depois fui correndo para casa. Coloquei as roupas de trabalho (Saia marrom até os joelhos, jaqueta de couro,blusa verde desbotada e coturnos) e fui andando para o trabalho. Eram apenas 5 minutos de casa até o trabalho (por isso eu sempre era acordada pelo barulho do primeiro trem). Tinha tempo então parei numa vitrine. Duas garotas (uma de vestido malva e laço verde, outra de vestido verde e laço malva) se derretiam olhando pela vitrine. Ela gritava: “Novos vestidos chegados há 5 minutos de Paris!”. Mas, de repente, outros vestidos completamente diferentes se materializam na vitrine. “Novos vestidos chegados nesse instante de Paris!” a vitrine grita. Mas e mais garotas se aglomeram em torno da vitrine. A maioria delas reclamando que sua roupa já está fora de moda.

Olho-me no vidro. Jaqueta de couro não abotoada. Coturnos. Saia curta e folgada. E, aquela cintura provavelmente nunca sentiu um espartilho na vida. E o cabelo dela... Curto! Que afronta! Que ofensa! Pálida. Uma cara que simplesmente indicava tédio. Esta mulher (não, ela não é uma dama, é uma mulher) é um espantalho. Que repugnante.
Dou um sorrisinho cínico. Que damas (elas sim, são verdadeiras damas) são tão estúpidas...

- Está espantando os clientes. Saia- um homem grande de terno vem dizer a mim.

- Perfeitamente, senhor- eu levanto minhas saias demais e mostro uma parte da minha coxa num sinal de afronta. Elas me olham. Algumas horrorizadas, outras arrogantes.
Logo chego à estação. Lá, painéis luminosos dizem o horário de embarque e desembarque de passageiros. Outros, simplesmente mostram a última moda. A de 13:35 mostra uma mulher com peruca loira cacheada, penas rosas e cachecol cheio de plumas, rosa também. O vestido ia até um pouco acima dos joelhos, bem apertado. Um laço marcava a cintura finíssima. Estas eram as chamadas Permanentes, modas que podiam ficar até por meses. Eram raras e muitíssimo caras.

Fui ao encontro de Irene na oficina. Assim como meu irmão, ela já tem 21 anos. Vai se casar com ele depois que eu puder substituí-la no trabalho.

- Atrasou-se, Charissa- ela disse. Eu dei um sorriso torto.

- Bom te ver também.

- O Sr. Liddell não vai ser tão tolerante com atrasos assim quando for seu chefe.

- Não se eu prestar a ele favores.

Irene parecia chocada.

- Charissa! Preserve sua decência!
Eu ri. Fomos até o galpão onde ficavam as locomotivas quebradas. Tinham apenas 3. Modelos velhos. Eu estava acostumada a consertá-los.

A primeira foi fácil. Problemas na caldeira. A segunda também foi fácil. Simplesmente haviam pedras nas engrenagens que moviam as rodas. Na terceira, tivemos de soldar peças soltas. Nada mais. Pronto. Tínhamos acabado.

- Vamos pegar o dinheiro- ela disse.

Eu tinha sorte. Ganhava 50 centavos de libra por dia. Quando eu fosse chefe, ganharia 1 libra por dia. 6 libras em uma semana. 27 libras por mês. 324 libras por ano. Era muito, muito dinheiro. Um peixe no mercado custava 25 centavos de libra. 7 dias por semana, mais batatas que custavam 10 centavos de libra a unidade. 35 centavos de libra por dia. 2,45 libras por semana. 9,8 libras por mês. 117 libras por ano com comida. O resto daria para eu pagar galões de água por 10 centavos a cada semana. E ainda sobraria dinheiro para a faculdade de Jasper. Perfeito. Talvez eu até conseguisse manter um corte de cabelo mais longo e comprasse algumas saias até a canela.

Saí as 17:00. Comprei peixe e batatas na feira para amanhã. Meu pai, minha mãe, Hazard, Jasper e eu comemos as 18:00. Jasper dormiu as 19:00. Estava limpando a cozinha com a minha mãe quando ouvi o conceituado jornalista Richard Malborough falar “BOLETIM URGENTE”.

- Vá lá ver o que é, Charissa- mamãe disse enquanto esfregava o balcão, ainda com resquícios de pele de peixe.

“Hoje, devido a invasão da Bélgica pelo Império Alemão, violando a soberania que o Império Britânico e o mesmo Império Alemão asseguraram há muito tempo atrás, o Império Britânico hoje declarou oficialmente guerra ao Império Alemão e seus aliados”.

sábado, 31 de março de 2012

Os Jardins de Frederico



Foi numa tarde ensolarada em Schoferheide, cidade prussiana nos arredores de Berlim, que ainda não havia sido engolida pela industrialização (apesar de que as cortinas de fumaça berlinenses já chegavam a cidade). Mas a cidade era uma das poucas que possuíam bastante área verde.

Uma dessas áreas verdes era o Friedrichshof, ou "Tribunal de Frederico" em português (ficava em frente ao tribunal de justiça, e por isso o jardim tinha esse nome). Pelo que nossos pais contavam, Friedrichshof já foi uma área de intenso lazer para a população de Schoferheide, um lugar onde nobres, burgueses, camponeses e operários se reuniam livremente aos domingos. Mas, no distante ano de 1867,  um louco chamado Werther Schewiger assassinou um nobre da cidade, graf Albert von Luhmmenberg, e sua esposa, Charlotte von Luhmmenberg, por quem estava apaixonado. E mais seis crianças que estavam presentes no momento, e depois se matou.

Essa é apenas a primeira parte da história. Agora, contarei a outra.
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Em 1890, eu estava com meus amigos, naquele domingo de tarde, caminhando na praça da cidade. Do outro lado da rua, estava Friedrichshof. Olhávamos para aquele jaridm abandonado. O chafariz cheio de lodo. As plantas altas. Elas cobriam os túmulos das vítimas do Massacre de Friedrichshof.

Do outro lado de Friedrichshof, Liesel passeava com suas amigas. Elisabeth Strauss tinha o cabelo loiro escuro grande, que lhe chegava ao meio da costa, postura perfeita, mãos delicadas e olhos verdes enormes, que lhe pareciam saltar as órbitas. Era o objeto de paixão de Rolf Langesdorfer, um colega nosso.

- Feches a boca por que se não entra inseto!- eu falei brincando. Rolf era 1 ano mais velho que Liesel, tendo 15 quando ela tinha 14. Nos somos de família burguesa, é verdade. Rolf era um burguês, com pais ricos, e Liesel também. Mas o pai de Liesel nunca concordaria em casar sua filha mais velha com ele, por razões que ignoro.

- Ah, vão fazer algo de útil!- ele disse, nos espantando com a mão.

- Deves provar tua coragem para que ela tenha qualquer interesse em ti, amigo- Nikolaus (nosso amigo, cujo apelido era Klaus) disse, batendo em na costa dele.

- É! Que tal entrares em Friedrichshof? Ela lhe cairia de joelhos!

Eu realmente duvidei que o covarde Rolf fosse fazer isso. Mas dessa vez ele deve ter enfezado. Disse, com raiva:

- Claro! Eu vou lá!

Saiu com pressa e nós fomos segui-lo. Liesel e suas amigas agora olhavam para nós, preocupadas.

Ele pulou o portão de Friedrichshof e sumiu na mata. Liesel veio correndo até nós.

- Por que ele fez aquilo?! É louco?! Todos sabem que Friedrichshof é assombrado!

Não sabíamos o que dizer. Liesel sentou-se no meio fio e ficou chorando compulsivamente, sendo consolada pelas amigas, que olhavam feio para nós.

Estava escurecendo. Ela, com as lágrimas ainda lhe enfeiando o belo rosto, levantou-se subitamente.

- Já chega. Chamarei o chefe de polícia!

Quando ela ia fazer isso, ouvimos um grito aterrorizado, e Rolf voltou correndo.

- Abram esse portão, pelo amor de Deus, ABRAM ESSE PORTÃO!

Klaus, o mais forte de nós, quebrou a fechadura do portão com o punho e Rolf disse:

- VENHAM, FUJAM AGORA!- Nós fomos correndo com ele.

Eu nunca soube direito porque ele ficou assim. Acho que algum dos fantasmas queria se vingar de quem lhes estava perturbando o sono eterno.

Mas ninguém nunca mais voltou a Friedrichshof

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Conto 1- Problemas de Guerra


  Charlotte corria como nunca, agarrando o braço de Josephine com toda a sua força. “Corra, Jo, Corra!”,ela gritava. Era uma noite chuvosa. As duas estavam com medo. Medo de um bombardeio. Medo de morrerem. Mas tinham que se arriscar. Charlotte tentava mostrar coragem, mas morria de medo. Jo sabia disso. Corriam como duas loucas, como se suas vidas dependecem disso. E dependiam mesmo.
- Pare!-, Charlotte gritou perto de Jo, que jurou ter quase estourado os tímpanos.
- É agora, certo...21:23 começa.
- Ah, Charlotte, o que estamos fazendo aqui?!
- Quieta!
Jo se aquietou. Melhor pra ela.
Elas eram enfermeiras por causa da Guerra, cuidavam dos fracos, não tinham medo de sangue. Tinham medo de serem pegas, mas principalmente de bombas. Elas eram tudo.
- Pronto. Calma, devagar...
Charlotte se esgueirou e entrou no Palácio de Buckingham. Perfeito.
- Vamos, Josephine!
“Ih, isso é mal”, Jo pensou. Se Charlotte a chamasse de Josephine, ela estava irritada. E Charlotte-Louise irritada não era bom.
Elas atravessaram o jardim. Estava florido. Apesar de tudo. Uma parte do Palácio estava destruída, e Jo sentiu seus olhos se encherem de lágrimas por causa disso. Nem eles escaparam.
- Vamos, Josephine!-, agora Charlotte grunhiu. Jo ficou com mais medo ainda.
- Calma!
Ela estava pálida de medo.
- Josephine, você é uma garota de 14 anos. Então, aja como uma.
O.K, aquilo tinha irritado Josephine. Ela agia sim como uma garota de 14 anos. Garotas de 14 anos não choravam quando viam moribundos. Como Charlotte, aos 16, fazia.
- Cale-se.
Elas foram se esgueirando, às vezes parando, às vezes correndo. Até que elas pularam uma janela. Jo achou que, definitivamente, Charlotte estava ficando louca.
- Charlotte, você...
- Cala a boca!
- Tá, vamos lá.  Certo. Pegue o taco de baseball que papai trouxe dos EUA.
- Onde está?
- Na minha bolsa.
Jo hesitou.
- Diga-me uma coisa: Como...
- Só cala a boca e faz o que eu pedi droga!
- Tá!-, ela sussugritou. Isso é sussurrar e gritar ao mesmo tempo. Com certeza você já sussugritou antes.
Surpreendentemente, o taco estava lá.
- Agora, vamos!
Elas andaram pelos corredores do palácio. Até virem de relance uma pessoa andando.
- Venha!
Charlotte puxou com força o braço de Jo. Doeu.
Elas entraram em um cômodo escuro. Acenderam a luz. E entraram em choque.
A rainha olhava para eles espantada.
- Oh!-, ela tinha feito. Parecia em estado de choque. Mas ela procurava alguma coisa na mesa. Elas provavelmente teriam problemas.
- Agora!
Charlotte pegou o taco de baseball e bateu com tudo na cabeça da Rainha, que caiu desmaiada.
Agora, elas estavam em estado de choque.
- Charlotte...-, Jo sussurrou- E se nós...Matamos a Rainha?
- Quieta!
Elas saíram apressadas, correndo. Daqui a pouco, alguém provavelmente entraria no cômodo. Provavelmente a Rainha não tivesse morrido. Provavelmente a Rainha se lembraria delas. E provavelmente elas ficariam em uma cela até a Guerra acabar.
Ou seja: Por um tempo, provavelmente longo, e indefinido.
As probabilidades não eram nada boas.
- Ah, não!
Elas esbarraram com uma garota. Ela parecia ter 16 anos, como Charlotte. Era loira e tinha os olhos claros e gentis. Parecia nervosa.
-  Ahn, você é...
- Elizabeth, Lilibeth, Alexandra, Mary, Princesa Elizabeth, etc., etc. Sim, sou eu.
 - Princesa-, as duas disseram ao mesmo tempo, segurando a barra do vestido e se abaixando um pouco.
- Levantem-se. Olha, papai, minha irmã e provavelmente minha mãe ainda estão dormindo. Eu não sei como, mas estão. Então, simplesmente me digam, em 30 segundos, o que estão fazendo aqui e o que foi aquele barulho antes de eu chamar os guardas.
Ela parecia impaciente.
- Ela ainda não sabe? Ai!
Charlotte beliscou Josephine
- Ahn, não sei de quê?
- Nada. Bom, certo, nós...
- Esperem.
Ela mostrou um colar verde, feito de jades, com um leão gravado. Charlotte tirou outro colar, feito de âmbar, com outro leão gravado. Elizabeth abriu um sorriso.
- Lottie!
- Liz!
- Vocês se conhecem?!
- Sim! Eu dei esse âmbar para Lottie dois anos atrás! As princesas da Bélgica, certo?
- Sim! Olha, Liz, estamos meio encrencadas, será que você poderia...
- Claro! Vão logo!
- Tchau, Liz!
- Tchau, Lottie!
Elas saíram pelo palácio pela janela do quarto de Liz. Ficaram andando pelas ruas de Londres, para se dirigir ao metrô, onde passariam a noite.
- Lottie, a coisa que você estava falando... Já são 21:30.
Charlotte parou por um instante, chocada.
- Tudo bem, não era nada-, ela fingiu.- Vamos.
Elas seguiram seu caminho, com Jo desconfiando que havia algo de muito misterioso com sua irmã Lottie.
No Palácio de Buckingham, algum tempo depois...
- Amor, você está bem?-, o Rei perguntou. Ela fez que sim com a cabeça.
- Diga, alteza, como eram seus agressores?
- Um era mais alto do que o outro. Tinha o cabelo loiro, e olhos azuis, tenho quase certeza que era uma mulher. A outra era menor, tinha o cabelo castanho e os olhos azuis.
- Ah, mamãe, deve ter sido uma miragem, sabe? Essa Guerra ainda nos deixará loucos. É o estresse.
- É, querida é o estresse.
- Mas eu...
- Vá descansar.
A Rainha foi sob protestos. E Elizabeth pensava: “Aquelas duas ainda estão me devendo”.